quarta-feira, 27 de maio de 2020

A QUINA FOI DESCOBERTA POR UM CARMELITA




A QUINA FOI DESCOBERTA POR UM CARMELITA

Wilmar Santin

Há uma grande polêmica sobre o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina para curar a doença provocada pelo coronavírus. Ainda que a cloroquina esteja sendo usada no tratamento da Covid-19 em momentos de maior gravidade da doença, estudos em vários países revelam que a medicação não possui efeitos relevantes e universais. Aliás, há o alerta de médicos que a cloroquina tem efeitos temerários no combate ao coronavírus, inclusive, por ser tóxica e ter efeitos colaterais fatais em muitos casos. Um estudo com cloroquina no combate ao coronavírus, feito em Manaus, foi interrompido devido aos efeitos colaterais em pacientes.[1] Outro estudo realizado com mais de 96 mil pessoas mostrou que o uso da cloroquina ou da hidroxicloroquina aumenta o risco de morte nas infectadas pela Covid-19.[2]
Em resumo: a ciência ainda não deu sua palavra final sobre este assunto, pois ainda não há comprovação científica da eficácia da cloroquina (CQ) ou da hidroxicloroquina (HCQ) contra essa doença. Antes ao contrário, é cada vez mais consenso em renomados centros de estudo médico a orientação para não se usar este medicamentos no tratamento da Covid-19.
Se por um lado o uso da cloroquina é controverso em relação ao tratamento contra a Covid-19, de outro, o uso da mesma é ponto pacífico para tratamento contra a malária.
Corre pela internet nas redes sociais de que o inventor da cloroquina é o médico-patologista-cientista paraense Dr. Gaspar Vianna, que faleceu em 1914 aos 29 de idade. Essa afirmação carece de fundamento e parece ser “fake”.[3] O Dr. Gaspar foi realmente um grande pesquisador. Seu principal legado para a humanidade foi sua pesquisa sobre a cura da leishmanios
A cloroquina (CQ) foi descoberta em 1934 pelo investigador Hans Andersag da Bayer[4], enquanto que a hidroxicloroquina foi sintetizada pela primeira vez em 1946.
Esses dois medicamentos têm sua origem na quina ou quinino, que tem um amplo uso no tratamento contra a malária há quase 3 séculos.
É neste contexto que se pergunta: quem a descobriu e começou o seu uso? quando? onde?
Não se sabe o nome do descobridor nem quando e exatamente onde, mas sabe-se que foi um missionário carmelita no rio Solimões, Amazonas.
Em 1838, Antonio Ladislau Monteiro BAENA em seu livro Compêndio das Eras da Província do Pará afirma: Em um papel inedito vimos a asserçaõ de que um Missionario Carmelita descobrira Quina no Rio Solimoens: mas não expressa nem o nome do Missionario nem o logar de descoberta”.[5]
Os carmelitas assumiram as missões no rio Solimões em 1697 e ficaram naquela região até os finais do século XVIII.[6] Inclusive tiveram um papel preponderante na ampliação e fixação da fronteiras brasileiras naquela região. Muitas cidades do Amazonas tiveram sua origem a partir das missões carmelitas, como por exemplo: Coari, Tefé e São Paulo de Olivença. Portanto, além da afirmação de Baena de que foi um missionário carmelita da região do rio Solimões quem descobriu a quina, pode-se acrescentar que ele trabalhou ali entre 1700 e 1800. Mais do que isso, só se for encontrado algum outro documento. [7]

Itaituba, 27 de maio de 2020.




[5] BAENA Antonio Ladislau Monteiro. Compêndio das Eras da Província do Pará, Typographia de Santos e Santos Menor, Pará: 1938, p. 226.
[6] A título de informação sobre a presença de carmelitas na região do rio Solimões, pode-se indicar os missionários Frei José de Santa Teresa Neves, O.Carm., que era pároco do Lugar de Nogueira, situado duas léguas de Tefé, e Frei José Álvares das Chagas, O.Carm., pároco nas igrejas paroquiais do São José do Lugar de Javari e de São Francisco Xavier do Lugar do Tabatinga, conforme a Certidão sobre os Padres Carmelitas ao serviço do Bispado, de 1º de Março de 1793 (AHU. Pará – Papéis Avulsos, II Cx 3, 1793).

quinta-feira, 7 de maio de 2020

Encíclica “LACRIMABILI STATU INDORUM” de Pio X (1912)


Encíclica “LACRIMABILI STATU INDORUM” de Pio X (1912)


Tradução: Pe. Giuseppe Viani, CSCh   


Profundamente comovido pelo estado lamentável dos índios da América do Sul, o nosso ilustre predecessor, Bento XIV, defendeu-os como é bem sabido, na Encíclica Imensa Pastorum, datada de 22 de dezembro de 1741; pois as situações que ele deplorou em seu escrito, essas mesmas, devemos deplorar hoje em muitos lugares; por isso convidamos, com solicitude, a lembrar dessa encíclica.
Nela, de fato, entre outras coisas, o Papa Bento se queixa que, embora por longo tempo a Sé Apostólica tivesse se empenhado para aliviar a miserável condição deles, no entanto, houve “homens, que se diziam professar a verdadeira fé”, e que, esquecidos do senso de caridade, infundidos em nossos corações pelo Espírito Santo, acham que é lícito para os pobres índios, não somente para os que ainda não receberam o dom da fé, mas também aos que foram banhados com o sagrado banho da regeneração, de reduzi-los à escravidão, ou vendê-los como escravos, ou privá-los de seus bens, e de agir com tamanha desumanidade no confronto deles, capaz de tirar-lhes o desejo de abraçar a fé em Cristo e reforçar cada vez mais o ódio contra a mesma.
A pior destas ações indignas, isto é a escravidão, pouco tempo depois, pela graça da misericórdia de Deus, foi abolida: e para aboli-la, no Brasil e em outras regiões, muito contribuiu a maternal insistência da Igreja perante os ilustres homens que governavam àqueles países. E reconhecemos, verdadeiramente que se não tivessem oposto muitos e grandes obstáculos de situações e ambientes, os seus intentos teriam conseguido resultados muito melhores. Reconhecemos que alguma coisa foi feita em prol dos Índios, porém, deve-se dizer que é muito mais o que resta por fazer.
Na verdade, quando consideramos os abusos e crimes que se cometem constantemente contra eles, não tem como não ficar horrorizados e sentimos uma profunda comiseração por este povo infeliz. O que pode existir de mais cruel e bárbaro que matar homens, muitas vezes por razões superficiais e não raramente por puro prazer de torturar, ou com golpes e ferros ardentes, ou, movidos por uma repentina violência, matando centenas e milhares, ou saquear vilarejos e aldeias dos índios: dos quais, ficamos sabendo que algumas tribos nestes últimos anos foram quase destruídas? O desejo desenfreado de lucro certamente atiça muito os ânimos, mas para isso contribui bastante a natureza do clima e a posição geográfica daquelas regiões. De fato, sendo aqueles lugares sujeitos a um clima tórrido, que, dando ao corpo uma certa moleza, enfraquece também a força dos ânimos; e encontrando-se longe da prática da Religião, da vigilância do estado, e, de certa forma, do mesmo consórcio civil, facilmente acontece que, se os que ainda não estão perdidos em hábitos imorais, chegam lá, em breve tempo iniciam a depravar-se, e aos poucos, eliminados os freios do dever e das leis, se precipitam em todos os excessos dos vícios. Com efeito não é para perdoar-lhes a fraqueza do sexo e da idade, aliás nos envergonha relatar suas malvadezas e crueldades comprando e comercializando mulheres e crianças; verdadeiramente deles se poderia dizer que foram superados os exemplos mais extremos da obscenidade pagã.
Nós, por algum tempo, quando ouvíamos relatos a respeito desse comportamento, tínhamos dúvidas para acreditar tamanha atrocidade dos fatos: nos pareciam inacreditáveis. Mas após confirmados com muitíssimos testemunhos, isto é, da maior parte de vós, veneráveis Irmãos, dos delegados da Sé Apostólica, dos missionários e de outras pessoas totalmente dignas de fé, já não nos é mais lícito ter dúvidas sobre a verdade dos fatos.
Desejosos, há muito tempo, de reparar, por quanto está em nosso poder, a tantos males, pedimos a Deus, com humildes e suplicantes preces, que queira nos mostrar benignamente algum meio oportuno para curá-los. Mas ele, que é o amorosíssimo Criador e Redentor de todos os homens, tendo-nos inspirado de trabalhar pelo bem-estar dos Índios, certamente nos dará os meios para conseguir este objetivo. Muito nos consola o fato que os que governam aqueles países, se esforçam com todos os meios para cancelar esta ignomínia e mancha de seus países: por tal empenho expressado por eles, jamais poderemos louvá-los e aprová-los como convém. Embora naquelas regiões, longe das sedes dos governos, distantes e pela maior parte inacessíveis, estes esforços dos poderes civis, plenos de humanidade, seja pela astúcia dos malvados que ultrapassam as divisas em tempo, seja pela inércia e perfídia dos administradores locais, frequentemente pouco resolvem, e não raramente são inúteis. Porém se à obra do Estado se ajuntasse a obra da Igreja, então os frutos desejados seriam muito mais abundantes.
A vós, portanto, veneráveis Irmãos, antes que a qualquer outro, apelamos para que prestem especiais cuidados e atenções para esta causa que é muito digna do vosso ofício e ministério pastoral. E deixando o resto à vossa solicitude e zelo, antes de qualquer outra coisa, vos exortamos a promover primorosamente e com toda atenção, em vossas dioceses, aquelas instituições voltadas para o bem dos Índios, e ao mesmo tempo procurar instituir outras que vos pareçam úteis para a mesma finalidade. Advirtam, pois, com diligência, os vossos fieis, sobre o sagrado dever de ajudar as missões aos Índios, que foram os primeiros a habitar o solo brasileiro. Saibam, portanto, que podem contribuir por esta causa de duas maneiras, com a coleta de ofertas e com o apoio das orações; e isto para favorecer não somente a Igreja, mas também a Pátria. Vós, pois, e em qualquer lugar onde se leva a sério a boa educação dos costumes, isto é, nos seminários, nos institutos juvenis, nos educandários femininos, e sobretudo, nos templos sagrados, façam com que nunca falte a recomendação e a pregação da caridade cristã, que considera todos os homens como irmãos sem nenhuma discriminação de nacionalidade e de cor; isto deve ser provado não apenas com as palavras, mas com os fatos. Igualmente não se deve deixar nenhuma ocasião, oportuna, para demonstrar quanta desonra espalham sobre o nome cristão estas situações indignas que aqui denunciamos.
No que diz respeito a nós, tendo não sem razão, boa esperança do consenso e favor dos poderes públicos, teremos aquele cuidado para ampliar, em tão vastas regiões, o campo da ação apostólica, dispondo outras estações de missionários, nos quais os Índios encontrem refúgio e proteção para a saúde. De fato, a Igreja Católica nunca foi estéril de homens apostólicos, os quais, impulsionados pela caridade de Jesus Cristo, estiveram prontos e preparados até a dar a própria vida pelos irmãos. E hoje, mesmo quando muitos ignoram ou abandonam a fé e o ardor de difundir o Evangelho aos Bárbaros, não só não diminui entre os membros de todo o clero ou entre os religiosos/as, mas cresce e se difunde amplamente pela ação do Espírito Santo que socorre a Igreja, sua esposa, segundo as necessidades dos tempos. Por isso achamos oportuno se servir em grande escala daquelas ajudas que, pela Graça divina, nos foram concedidas, para libertar os Índios da escravidão de Satanás e dos homens perversos, quanto maior for a necessidade que os preme. Além disso, tendo em vista que os pregadores do Evangelho banharam estas terras não somente com seu suor, mas também frequentemente com seu sangue, temos confiança para o futuro que de tantas fadigas, enfim, floresça uma alegre messe com ótimos frutos de humanidade cristã.
Portanto, para que tudo aquilo que, ou por vossa iniciativa, ou por nossa exortação, fareis em favor dos Índios, tenha uma pródiga eficácia, pelo apoio vindo da nossa autoridade apostólica, Nós, seguindo o exemplo do nosso recordado predecessor, condenamos e declaramos réus deste cruel crime todos que, como diz o mesmo, “ousam ou presumam reduzir em escravidão os Índios dos quais falamos acima, vender, comprar, comutar ou doá-los, separá-los das mulheres e dos filhos, espoliá-los de suas coisas e bens, conduzi-los ou transferi-los em outros lugares, ou, de qualquer maneira, privá-los da liberdade ou retê-los escravos; nem oferecer àqueles que assim agem, conselho, ajuda, favor e apoio sob qualquer pretexto e motivo, ou pregar ou ensinar que tudo isso é lícito, e tenham a ousadia ou presumam cooperar de qualquer outra maneira com quanto dito acima.” Queremos, portanto, reservar aos Ordinários locais o poder de absolver os penitentes destes crimes no fórum do sacramento da Penitência.
     Veneráveis Irmãos pensamos de escrever-vos estas coisas em favor dos Índios, e obedecendo ao nosso ânimo paterno, e seguindo os rastros de muitos dentre os nossos predecessores, entre os quais particularmente, Leão XIII, de feliz memória. Caberá a vocês combater com todas as forças para que nossos votos sejam plenamente satisfeitos.
     Certamente vos sustentarão nesta obra os que governam estes países; não deixarão seguramente de assistir-vos, com a ação e o conselho, os sacerdotes, e em primeiro lugar os que se dedicam às Sagradas Missões; enfim aderirão todos os homens bons, e ajudarão a causa, os que podem, com o dinheiro, ou com outras formas de caridade, causa na qual são empenhadas juntas as razões da Religião e da dignidade humana. Mas, o que é de capital importância, vos assistirá a Graça de Deus onipotente; auspício da qual e ao mesmo tempo atestado pela nossa paterna benevolência, a vós, veneráveis irmãos e às vossas greis enviamos nossa bênção apostólica.
     Dada em Roma, São Pedro, no dia 07 de junho de 1912, nono ano do nosso pontificado.
PIO PP. X


Seguidores