quinta-feira, 7 de setembro de 2023

A pesca milagrosa (Lc 5,1-11)

 



A pesca milagrosa (Lc 5,1-11) 

 

O evangelista Lucas nos diz que Jesus “ensinava nas sinagogas e todos o elogiavam” (Lc 4, 13). Porém, quando Jesus foi à sinagoga de Nazaré, no dia de sábado, leu um texto de Isaías e ensinou, foi rejeitado (Lc 4,14-30). Ao retornar a Cafarnaum, tudo voltou ao normal: no sábado, ensinou na sinagoga e foi reconhecido como alguém que fala com autoridade (Lc 5,1-11). Apesar do reconhecimento e sucesso, Jesus percebeu que não podia pregar apenas nas sinagogas, porque seria manter-se na zona de conforto. Isso está evidente nas próprias palavras de Jesus: “Eu devo anunciar a Boa-Nova do Reino de Deus também a outras cidades” (Lc 4,43). Porém, não se limitou a ensinar ao povo das cidades, foi também para os campos e às margens do lago de Genesaré. Em todos os lugares, as multidões corriam “para ouvir a palavra de Deus” (v. 1). Portanto, todos percebiam que o ensino de Jesus era “Palavra de Deus”. As multidões eram atraídas por Jesus e sentiam prazer em ouvi-lo. Pudera, Jesus “ensinava como quem tem autoridade, não como os escribas” (Mt 7,29; Mc 1,22).

Às margens do lago de Genesaré teve contato com os pescadores Simão, André, Tiago e João. Simão Pedro ouviu os ensinamentos de Jesus, visto que foi da barca dele que Jesus “anunciou a Boa-Nova do Reino de Deus”. O texto sagrado diz: “Subindo numa das barcas, que era de Simão, Jesus pediu que se afastasse um pouco da margem. Depois sentou-se e, da barca,  ensinava as multidões” (v. 3).

Ao terminar de ensinar, Jesus viu que Simão tinha ficado extasiado e percebeu que ele poderia ser convocado para ser “pescador de homens”. Assim  começou uma ação para conquistar Simão em seu próprio campo: a pesca. Os pescadores tinham pescado a noite toda e tinham retornado com as redes vazias, ou seja, “o mar não estava para peixe” ou “a lua não estava boa”, como se diz popularmente. Simão e seus companheiros estavam cansados e frustrados. Mesmo assim, Jesus se animou e pediu para que Simão fizesse mais uma tentativa, mas que fosse “para águas mais profundas” (v. 4). A resposta de Simão, "Mestre, nós trabalhamos a noite inteira e nada pescamos” (v. 5), foi educada, expressando que que Jesus podia entender de reza e de boas mensagens, mas que de pesca os entendidos eram eles. No entanto, como ele tinha ficado impactado com as palavras de Jesus, concluiu: “Mas, em atenção à tua palavra, vou lançar as redes”. Portanto, Simão Pedro foi capaz de abrir mão da própria experiência de pescador para se deixar surpreender pela força da Palavra. Consequentemente a palavra de Jesus teve mais força do que a sua frustrante experiência da noite. O obedecer a Jesus e jogar as redes em águas mais profundas possibilitou o milagre da chamada pesca milagrosa.

Foi só depois desta dupla experiência, que Jesus chamou Pedro. Ele e seus companheiros, “fisgados” por Jesus, largaram tudo  e se tornaram “pescadores de homens”.

Muitas vezes pensamos que Deus deve fazer algo extraordinário, como essa pesca milagrosa, para termos a coragem de nos comprometermos radicalmente com a causa do Reino. Na época em que eu devia fazer os votos perpétuos, passei por isso: eu queria um sinal de que estava sendo chamando a ser carmelita e depois padre. Vivia numa crise. Numa conversa com frei Enedino, ele me disse que teve a mesma dificuldade. Só superou tudo quando percebeu que raramente Deus dá um grande sinal e que é nas experiências simples do dia-a-dia que Deus revela a sua vontade. Em seguida me perguntou: “Durante todo este tempo de formação seminarística, como você tem se sentido?” Respondi: “Muito bem e feliz!” Então ele me disse: “Este é o grande sinal de que você é chamado!”

Sem entrar em detalhes, após um acidente em que eu e um padre lá na Itália quase caímos num precipício, todo o povo dizia que foi um milagre. O velho pároco dizia que não foi milagre algum, que milagre é quando não acontece nada. Constantemente repetia: “Faz 46 anos que subo e desço esta montanha e nunca aconteceu nada! Como foi acontecer desta vez?” Não encontrava resposta. Dois dias após, durante o almoço, mais uma vez repetiu que tinham sido 46 anos sem acidente. Naquele momento lhe disse: “Então Pe. Mário, foram 46 anos de milagre!” Ele respirou fundo e disse: “Você tem razão, eu não tinha pensado nisso!” É, devemos estar atentos à presença e ação de Deus no corriqueiro de nossas vidas e não só nos momentos extraordinários!

Concluo com a palavras do Papa Francisco: “Não era um momento adequado para pescar, em plena luz do dia, mas Pedro confia em Jesus. Ele não se baseia nas estratégias dos pescadores, que conhecia bem, mas na novidade de Jesus. Naquela admiração que o levava a fazer o que Jesus lhe dizia. É assim também para nós: se acolhermos o Senhor na nossa barca, podemos fazer-nos ao largo. Com Jesus, navegamos no mar da vida sem temor, sem ceder à desilusão quando não pescamos nada, e sem ceder ao “não há mais nada a fazer”. Sempre, tanto na vida pessoal como na vida da Igreja e da sociedade, há algo de belo e corajoso que pode ser feito, sempre. Podemos recomeçar sempre, o Senhor convida-nos a pôr-nos sempre em questão porque Ele abre novas possibilidades. Aceitemos então o convite: afastemos o pessimismo e a desconfiança e façamo-nos ao largo com Jesus! Também a nossa pequena barca vazia testemunhará uma pesca milagrosa” (Angelus de 6 de fevereiro de 2022).

+ Wilmar Santin, O.Carm.

07 de setembro de 2023.

Quinta-feira da 22ª Semana do Tempo Comum

quinta-feira, 17 de agosto de 2023

Dona Cesarina

 

Dona Cesarina com sua comadre Autevina



Dona Cesarina

 

 

Há certas pessoas que marcam as nossas vidas. O tempo passa, mas elas teimosamente permanecem em nossas lembranças. Uma das pessoas que, vira e mexe, recordo com carinho é uma antiga moradora da Vila Fanny, Curitiba, conhecida simplesmente como dona Cesarina. Toda vez que ela surge em minha memória, sinto uma sensação de paz, de alegria e de contentamento. Não consigo ficar sem dar pelo menos um sorriso.

Dona Cesarina era uma negra, neta de escravos, nascida na Lapa, PR. Sempre que se referia à sua cidade natal, falava com orgulho dos atos heroicos dos lapeanos, no “Cerco da Lapa”, referindo-se ao sangrento confronto que envolveu pica-paus (republicanos) e maragatos (federalistas), em 1894, durante a Revolução Federalista. Na ocasião tombou em combate o famoso General Carneiro. Mas seu grande orgulho mesmo era falar sobre a “Gruta do Monge”, localizada no Parque Estadual do Monge e que serviu de abrigo ao lendário monge João Maria, em meados do século XIX.

A primeira vez que ouvi falar da dona Cesarina foi uma história ligada à gruta. O frei Antonio Ferraz, que morava em Curitiba, me contou que os freis de Curitiba fizeram um passeio até a Lapa e visitaram a Gruta do Monge. Antes de irem, a dona Cesarina tinha recomendado para visitarem a Gruta do Monge, porque lá Nossa Senhora aparecia às pessoas que tinham fé. Ela disse que toda vez que visitou o lugar, sempre viu Nossa Senhora. Quando voltaram, ela perguntou se o frei Antonio tinha visto Nossa Senhora. Ele respondeu que não. Desiludida sentenciou: “Que vergonha! Hoje em dia nem mais os padres têm fé!”

Quando em janeiro de 1972 mudei para o convento dos carmelitas da Vila Fanny, em Curitiba, para fazer o noviciado, logo no primeiro domingo conheci a dona Cesarina. Já era uma pessoa idosa, não posso precisar a sua idade. Seu rosto transpirava a energia serena das almas fortes e tranquilas. Ela não faltava à missa um domingo sequer. Era uma figurinha carimbada na missa das 10h. Sempre chegava sorrindo e com a sua melhor roupa. Está na minha memória trajando um lindo vestido azul. Sempre brincávamos perguntado se ela estava procurando um noivo. Ela dava uma risada e dizia: “Eu não! Estou bem assim e não quero complicar a minha vida”. Um dia brinquei: “Nossa, dona Cesarina! Como a senhora está assanhada com este vestido azul!” Com bom espírito de humor e um olhar doce e meigo, ela retorquiu: “Se o frei está me achando assanhada, é porque está interessado, né! Quero dizer pro senhor que eu não estou interessada!” E soltou uma gargalhada. Naquele dia eu poderia ter ido dormir sem essa. Aprendi a lição!

Dona Cesarina nunca casou, mas teve uma filha chamada Ivone. Habitava numa pequena casa que ficava uma quadra e meia distante da igreja. Com ela moravam: sua irmã Maria José, cujo apelido era Tijé, o sobrinho Eugênio Barbosa e sua esposa Maria Rosa com os filhos Barbosa, Dirceu, Jussara e Maria Elisa. Seu sobrinho era muito trabalhador, porém, quando bebia perdia o controle. O problema era ele ficar um fim de semana sem beber. Portanto, essas bebedeiras do sobrinho se constituíam um dos “espinhos na carne” (cf. 2Cor 12,7) para a dona Cesarina.

Seus rendimentos vinham da lavagem de roupa “pra fora” que fazia em casa. Mas também contava com uma ajuda mensal de um médico chamado Dr. Alan, para o qual ela trabalhou como doméstica por muitos anos. Sem esta ajuda do Dr. Alan teria sido muito difícil colocar comida suficiente naquela casa em que 7 pessoas dependiam dela.

Durante quatro anos nós, carmelitas de Curitiba, compramos a comida pronta, da “Refeições Colonial”, que fornecia alimentação para funcionários de empresas. Sempre sobrava feijão, arroz, macarrão, etc. Jogar aquela comida fora, seria um pecado. Passamos a dar para a dona Cesarina. Está impregnada na minha memória a imagem dela toda feliz indo buscar a comida. 

Nas festas da Igreja, ela sempre se encarregava da salada. Com uma grande alegria e desejosa de prestar seu serviço à sua comunidade eclesial, ela passava o dia anterior à festa preparando a salada. Assim cumpria um dos grandes ensinamentos de Jesus: Quem quiser ser o maior entre vós seja aquele que vos serve, e quem quiser ser o primeiro entre vós, seja vosso servo. Pois o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate por muitos” (Mt 20,26-28).

Na década de 1970-80, no mês de outubro, a Arquidiocese de Curitiba organizava anualmente uma grande romaria para o Santuário de Nossa Senhora Aparecida. A Paróquia Nossa Senhora da Conceição sempre conseguia lotar um ônibus com um grupo organizado pelo frei Aleixo. A dona Cesarina não falhava, era sempre a romeira mais animada e devota. 

Para pagar a passagem e hospedagem, ela ia colocando moedas numa lata de leite Ninho. Evidentemente, devido à inflação, quando chegava o momento de pagar, o dinheiro guardado na lata não era suficiente. Por sorte, várias pessoas generosas faziam “uma vaquinha” e pagavam a sua passagem. Assim anualmente, ébria de felicidade, ia para Aparecida contagiando a todos com sua simpatia e alegria.

Costumava levar frango com farofa e bolachas pra comer durante a viagem. Numa das viagens, uma senhora se incomodou porque a dona Cesarina estava sempre comendo e reclamou. Prontamente recebeu a resposta: “Eu como com minha boca e a senhora não tem nada com isso. Eu estou com fome e vou continuar comendo!”

Certo dia lhe perguntei: 

- “Dona Cesarina, quantas vezes a senhora já foi para Aparecida?” 

- “Vinte sete vezes!”, respondeu.

- “Mas já não está bom?”

- “Não, porque no ano em que eu não for, será o ano da minha morte. Se eu não for lá, como vou aguentar todos os sofrimentos da minha vida?”.

Ali percebi claramente a força da piedade popular na vida das pessoas pobres e simples. Em 1975 na Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi – sobre a Evangelização no mundo contemporâneo, o Papa São Paulo VI chamava a atenção para a importância da religiosidade popular e esclarecia: “traduz em si uma certa sede de Deus, que somente os pobres e os simples podem experimentar; ela torna as pessoas capazes para terem rasgos de generosidade e predispõe-nas para o sacrifício até ao heroísmo, quando se trata de manifestar a fé; ela comporta um apurado sentido dos atributos profundos de Deus: a paternidade, a providência, a presença amorosa e constante, etc. Ela, depois, suscita atitudes interiores que raramente se observam alhures no mesmo grau: paciência, sentido da cruz na vida cotidiana, desapego, aceitação dos outros, dedicação, devoção, etc. Em virtude destes aspectos, nós chamamos-lhe de bom grado "piedade popular", no sentido religião do povo, em vez de religiosidade” (nº 48)[ [1] ].

Sobre peregrinações a santuários marianos, o Papa Francisco recomenda: “Aprendamos: quando há dificuldades na vida, procuremos a Mãe; e quando a vida é feliz, procuremos a Mãe para partilhar inclusive isto. Precisamos de ir a estes oásis de consolação e de misericórdia, onde a fé se exprime numa linguagem materna; onde colocamos as fadigas da vida nos braços de Nossa Senhora e regressamos à vida com a paz no coração, talvez com a paz das crianças” (Audiência Geral, 23/08/2023).

Uma vez fui em sua casa, encontrei-a agitada com um pedaço de pau na mão. Fiquei espantado e lhe disse:

- “Dona Cesarina, vim visitar a senhora e a senhora me recebe com um cacete querendo me dar uma camaçada de pau?”

- “Não, não quero bater no senhor não! Deus me livre de bater num padre! Valha-me Nossa Senhora Aparecida! Eu estou querendo matar uma cobra verde que apareceu aqui no quintal. Pra sorte dela e demorei pra encontrar este pau. Como ela é muito rápida, escapou”, prontamente explicou.

- “Mas Dona Cesarina, a senhora não sabe que matar cobra verde é um crime inafiançável? E se a senhora matar esta cobra, vai ser presa por 5 anos sem direito a ter um advogado?” 

Espantada, arregalou os dois olhos e, com um olhar de desdém e com uma cara manifestando desconfiança, me perguntou:

- “E por que matar cobra verde é crime inafiançável?” 

- “Porque tem que deixar a cobra amadurecer!”, retruquei.

Ela redarguiu num linguajar bem caboclo: “Quá! E cobra verde madróce?”

Como mencionei acima, a dona Cesarina já era idosa quando a conheci. Se olharmos a realidade de hoje em dia, o número de idosos tem aumentado muito. Felizmente a Igreja tem se preocupado com esta situação, por isso criou uma própria pastoral, a saber, a Pastoral da Pessoa Idosa. O Papa Francisco tem um carinho todo especial pelos idosos, tanto é que fez uma série 18 de catequeses sobre a velhice em 2022. Um ano antes já tinha instituído o “Dia Mundial dos Avós e dos Idosos”. Na ocasião da sua instituição, o Santo Padre mencionou a celebração da Festa da Apresentação de Jesus no Templo, que aconteceria dois dias depois, e citou os idosos Simeão e Ana que, “iluminados pelo Espírito Santo, reconheceram Jesus como o Messias” (Cf. Lc 2,22-40) e que “Eles recordam-nos que a velhice é um dom e que os avós são a ligação entre as gerações, para transmitir aos jovens a experiência da vida e da fé. Os avós são muitas vezes esquecidos e nós esquecemos esta riqueza de preservar as raízes e de as transmitir. Por esta razão, decidi instituir o Dia Mundial dos Avós e dos Idosos, que terá lugar na Igreja inteira todos os anos no quarto domingo de julho, na proximidade da festa dos Santos Joaquim e Ana, os “avós” de Jesus” [ [2] ] (Ângelus, 31/01/2021).

O Sucessor de Pedro tem sido coerente e todos os anos tem rezado, na Basílica Vaticana, uma missa solene no Dia Mundial dos Avós e dos Idosos. No primeiro ano de celebração deste Dia, Papa Francisco concluiu assim a sua homilia: 

Irmãos e irmãs, os avós e os idosos são pão que nutre a nossa vida. Sejamos agradecidos pelos seus olhos atentos, que se aperceberam de nós, pelos seus joelhos que nos deram colo, pelas suas mãos que nos acompanharam e levantaram, pelos jogos que fizeram conosco e pelas carícias com que nos consolaram. Por favor, não nos esqueçamos deles. Aliemo-nos com eles. Aprendamos a parar, a reconhecê-los, a ouvi-losNunca os descartemos. Guardemo-los amorosamente. E aprendamos a partilhar tempo com eles. Sairemos melhores. E juntos, jovens e idosos, saciar-nos-emos à mesa da partilha, abençoada por Deus”[ [3] ] (25/07/2021).

Pouca gente ainda se recorda da Dona Cesarina. Com o tempo a memória de sua existência está se apagando. Porém, ela não pode simplesmente ser descartada, merece ser lembrada como uma mulher forte e lutadora, deve ser reconhecida como uma verdadeira heroína e sua memória preservada, por isso, parodiando o grande locutor esportivo Fiori Gigliotti, carinhosamente concluo dizendo: “a Dona Cesarina ficará por todo o sempre incrustada na ternura e sinceridade do nosso cantinho de saudade”.

 

+ Wilmar Santin. O.Carm.

Itaituba, 15 de agosto de 2023.

Solenidade da Assunção da Virgem Maria



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quarta-feira, 16 de agosto de 2023

Leão XIII - Encíclica IN PLURIMIS sobre a escravidão

 

Encíclica “IN PLURIMIS” escrita pelo Santo Padre Leão XIII aos Bispos do Brasil sobre a escravidão (5-5-1888) [1] ]

 

 

 

 

Aos Nossos Veneráveis Irmãos Bispos Do Brasil

LEÃO XIII, PAPA

Veneráveis Irmãos, Saúde e benção apostólica

Dentre os muitos e grandes testemunhos de piedade, que quase todos os povos Nos manifestaram e continuam a manifestar, felicitando-Nos por motivo de Nosso quinquagésimo aniversário de sacerdócio, há um que particularmente Nos comove, e é o que Nos veio do Brasil, que por ocasião daquele feliz acontecimento, legalmente concedeu a liberdade a um grande número dos que ainda gemiam sob o jugo da escravidão nos dilatados domínios daquele Império.

Uma obra de tal magnitude, formada pelo espírito de caridade cristã e filha do zelo de varões e matronas, animados da mesma virtude e em união com o clero, foi oferecida a Deus, supremo autor e distribuidor de todos os bens, em testemunho de reconhecimento pela mercê, que tão benignamente Nos concedeu de atingirmos são e salvo a idade de Nosso ano jubilar.

 Isto foi-Nos sobremodo agradável e consolador, e mais que tudo porque logramos ver a confirmação duma tão feliz notícia, a de que os brasileiros queriam abolir desde já e extirpar completamente a barbárie da escravidão. A vontade do povo foi secundada pelo zelo desvelado do Imperador e de sua augusta filha, bem como pelos que dirigem a pública administração, havendo para isso promulgado e sancionado leis adequadas. Manifestamos a alegria que sentimos, especialmente quando, em Janeiro passado, declaramos ao enviado do augusto Imperador, que Nós mesmo escreveríamos aos Bispos do Brasil recomendando-lhes a causa dos míseros escravos (por ocasião de Nosso jubileu... Nós desejamos dar “ao Brasil um testemunho particular do Nosso paternal afeto com referência à emancipação dos escravos”. Resposta à mensagem do ministro do Brasil, Souza Correia).  Somos em verdade o Vigário de Cristo, Filho de Deus, que a tal extremo amou o gênero humano, que não só não se dignou fazendo-se Homem, habitar entre nós, senão que também, comprazendo-se em chamar-se Filho do homem, claramente protestou que se abatera à nossa condição a fim de anunciar aos cativos a sua libertação (Is. LVI, I, Luc. IV 19.) a fim de que, quebrando as algemas da escravidão que oprimiam o gênero humano, isto é, as algemas do pecado, restaurasse todas as coisas nos céus e na terra (Ef. 1, 10) deste modo restabelecesse na prístina dignidade toda a descendência de Adão contaminada pelo pecado original.

 Oportunissimamente disse a este respeito São Gregório Magno: Pois que o nosso Redentor, criador de todas as coisas, determinou livremente em sua misericórdia, assumir a natureza humana a fim de que, pela graça da sua divindade, esmigalhada a cadeia que nos prendia à escravidão, fossemos restituídos à prístina liberdade, é por sem dúvida obra mui salutar o restituir à liberdade os que tendo nascido livres por natureza o direito das gentes tornou escravos (Lib VI, ep. 12).

Convém, pois, e muito se compadece com a índole de Nosso Magistério apostólico, fomentar e promover poderosamente tudo o que pode assegurar aos homens, quer individual, quer coletivamente considerados, os auxílios adaptados ao alívio de suas inumeráveis misérias que provieram, como fruto de uma árvore corrompida, do pecado dos nossos primeiros pais; e estes auxílios, quaisquer que sejam, não somente influem eficazmente na civilização, mas também conduzem convenientemente a essa restauração integral de todas as coisas, que foi o ideal de Jesus Cristo Redentor dos homens.

 Ora, dentre tantas misérias aparece uma bem digna de ser vivamente deplorada, a da escravatura a que há tantos séculos está sujeita uma grande parte da família humana, gemendo na dor e na abjeção em menosprezo do estatuído primitivamente por Deus e pela natureza. E de fato, decretara o supremo autor de todas as coisas que o homem tivesse um como domínio real sobre todos os animais da terra, peixes do mar e aves do céu, e não que os homens exercessem domínio sobre os seus semelhantes.

Criando o homem racional, diz Santo Agostinho, Deus criou-o à sua imagem, e quis que fosse senhor apenas das criaturas irracionais, de modo que o homem exercesse domínio não sobre os homens, mas sobre os animais (Gen. I, 26).

De onde se conclui que o estado de escravidão de direito foi imposto ao homem pecador, e por isso é que nas Escrituras não encontramos a palavra escravos antes que o justo Noé vindicasse com tal palavra o pecado do filho. É pois proveniente este nome, não da natureza, mas do pecado (Gen. 1, 25, Noé c. XXX). Do contágio do primeiro pecado se derivam todos os males, e, sobretudo, essa perversidade monstruosa, em virtude da qual homens houve que, esquecidos da fraternidade original e desprezando os ditames da razão natural, não só não observaram entre si o mútuo amor e a mútua benevolência, senão que também, arrastados pela ambição, começaram a ter os outros na conta de inferiores a si, e por isso a tratá-los como animais nascidos para o jugo. Deste modo, não tendo em consideração alguma a identidade da natureza, a dignidade humana, a imagem divina impressa no homem, sucedeu que, graças às questões e guerras que ao depois estalaram, os vencedores escravizassem os vencidos, e a multidão, ainda que da mesma raça, se dividisse gradualmente em indivíduos de duas categorias distintas, a saber: os escravos vencidos sujeitos ao domínio dos vencedores seus senhores. 

A escravidão no mundo antigo

Deste lutuoso espetáculo é testemunha a história antiga até ao advento do Redentor; a escravatura propagou-se em todos os povos, e tão reduzido era o número dos homens livres que um poeta chegou a pôr nos lábios de César esta atrocidade: O gênero humano vive para poucos (Lucan. Phars. V, 343).

A escravatura estava em vigor nas nações mais civilizadas, entre os gregos e romanos, onde a dominação dum pequeno número se impunha à multidão, e esta dominação era exercida com tanta perversidade e orgulho, que as turbas de escravos eram considerados como bens, não como pessoas, como coisas desprovidas de todo o direito e até da faculdade de conservar a vida.

 Os escravos vivem sob o poder dos senhores, este poder emana do direito das gentes; em quase todas as nações vemos, com efeito, que os senhores tem direito de vida e de morte sobre os escravos, e tudo o que estes adquirem, adquirem-no para os seus senhores (Justinian, Inst. I. I, tit. 8, n. 1).

Deste transtorno moral seguiu-se que era lícito aos senhores permutar, pública e impunemente, legá-los como herança, matá-los, abusar deles para satisfação das suas paixões e da sua cruel superstição.

 Ainda mais, os que entre os gentios tinham a reputação de sábios, filósofos insignes, jurisconsultos doutíssimos trataram de se persuadir a si mesmo e de persuadirem a outros, por um supremo ultraje ao senso comum, que a escravatura nada mais é do que a condição necessária da natureza; e não se envergonharam de ensinar que a raça dos escravos era muito inferior em aptidões intelectuais e em beleza física à raça dos homens livres; que era necessário, por isso, que os escravos, instrumentos desprovidos de razão e de sabedoria, estivessem em tudo sujeitos à vontade de seus senhores.

 Esta doutrina desumana e iníqua é altamente detestável, e tal que uma vez admitida não há opressão, por infame e bárbara que seja, que não possa impudentemente sustentar-se com uma certa aparência de legalidade e de direito.

 A história abunda em exemplos de grande número de crimes e de perniciosos flagelos que a escravatura trouxe às nações; excitou-se o ódio no coração dos escravos, e os senhores viram-se reduzidos a viverem em apreensões e receios contínuos; aqueles preparavam os fachos incendiários do seu furor, estes exacerbavam as suas crueldades; os Estados viam-se abalados e expostos a todos os momentos à ruína pelo número de uns e pela força dos outros; numa palavra, da escravatura provieram os tumultos, as sedições, a pilhagem, as guerras e as carnificinas.

 Nesta profunda abjeção da escravatura viviam muitos, e tanto mais miseravelmente quanto mais profundas eram as trevas em que estavam submergidos, quando na plenitude dos tempos determinados por conselho divino, resplandece do alto dos céus uma admirável luz, e a graça redentora de Cristo se derrama copiosamente sobre todos os homens; em virtude deste benefício os homens foram levantados do lodo e do opróbrio da escravidão, e todos, sem exceção, remidos da servidão do pecado e sublimados à nobilíssima dignidade de filhos de Deus.

A caridade e a escravidão

Em verdade, os Apóstolos, desde os primórdios da Igreja tiveram o cuidado de ensinar e de inculcar, entre outros preceitos de uma vida santíssima, este, que repetidas vezes fora ensinado por São Paulo aos regenerados pelas águas do Batismo: Todos vós sois filhos de Deus pela fé em Jesus Cristo. Porque todos os que fostes batizados em Cristo, revestiste-vos de Cristo. Não há judeu, nem grego; não há servo, nem livre; não há macho, nem fêmea. Porque todos vós sois um em Jesus Cristo (Gal. III, 26, 28). Não há diferença de gentio e de judeu, de circuncisão e de prepúcio, de bárbaro e de seita, de servo e de livre; mas Cristo é tudo e em todos (Coloss. II, 11). Porque no mesmo espírito fomos batizados todos nós, para sermos um mesmo corpo, ou sejamos judeus, ou gentios ou servos, ou livres e todos temos bebido em um mesmo Espírito (I Cor, XII, 13).

Documentos são estes realmente áureos, honestíssimos e salutares, cuja eficácia não só redunda em honra e aumento do gênero humano, senão que também leva os homens, qualquer que seja a sua nacionalidade, a sua língua, a sua condição a unirem-se estreitamente pelos laços de uma caridade fraternal.

 Essa caridade de Cristo, da qual estava inflamado o beatíssimo Paulo, tinha-a haurido no próprio Coração dAquele que misericordiosamente se tornou irmão de todos e cada um dos homens, e que os enobrecera a todos sem exceção de um só, da sua própria nobreza, de modo a torná-los partícipes da natureza divina. Por esta mesma caridade se foram formando e constituindo divinamente as gerações e floresceram dum modo sobremaneira admirável para esperança e felicidade pública, até que, no decurso dos tempos e dos acontecimentos e graças ao trabalho perseverante da Igreja, as nações se puderam constituir sob uma forma cristã e livre, renovada à semelhança da família.

 Na verdade, desde o princípio a Igreja dedicou especial cuidado para que o povo cristão recebesse e observasse, como era de justiça, numa questão de tão súbito momento, a pura doutrina de Jesus Cristo e dos seus Apóstolos. Graças ao novo Adão, que é Jesus Cristo, subsiste a comunhão fraterna não só do homem com o homem, mas das nações entre si; e assim como todos tem uma só e mesma origem na ordem natural, assim também na ordem sobrenatural todos tem uma só e mesma origem de salvação e de fé; todos são igualmente chamados à adoção de um só Deus e Pai, porque todos foram remidos mediante o mesmo preço; todos são membros de um grande corpo; todos são admitidos a participar do divino banquete, a todos são oferecidos os benefícios da graça e os da vida imortal.

Postas estas coisas como base e fundamento, a Igreja, como terna mãe, esforçou-se em levar algum alívio ao peso e ignomínia da vida servil, definiu e inculcou veementemente os direitos e deveres recíprocos dos senhores e dos servos, consoante foram afirmados nas epístolas dos Apóstolos.

 Em verdade, os príncipes dos Apóstolos recomendavam aos escravos que tinham lucrado para Jesus Cristo: Sede sujeitos em todo o temor, não só aos bons e modestos, mas ainda aos díscolos (I Petr. II, 18). Obedecei aos senhores carnais com temor e com tremor, na simplicidade de coração, como a Cristo; não servindo só aparentemente, como para agradar aos homens, mas como servos de Cristo, cumprindo com todo o coração a vontade de Deus, servindo com boa vontade, como ao Senhor, e não aos homens; sabendo de mais que cada um, servo ou livre, receberá de Deus a recompensa do bem que praticar (Ef. VI, 5-8).

O mesmo São Paulo diz a Timóteo: Os que vivem sob o jugo da escravidão tenham os seus senhores como dignos de toda honra; aqueles que tem por senhores fiéis não os desprezem, porque são fiéis muito amados e porque são irmãos, mas sirvam-nos ainda mais participantes dos benefícios. Eis o que deveis ensinar e exortar (I Tim. VI, 1-2). A Tito igualmente ordenou que ensinasse os servos a serem submissos aos seus senhores, que os não contradissessem nem enganassem, mas que em tudo mostrassem boa fé, a fim de que a boa doutrina do nosso Salvador resplandecesse em todos (Tit. II, 9-10).

Assim é que aqueles primeiros discípulos da fé Cristã muito bem compreenderam, que a igualdade fraternal dos homens em Cristo de nenhum modo devia apoucar ou fazer esquecer o respeito, a honra, a fidelidade e os demais deveres a que eram obrigados para com seus senhores; e daqui provieram grandes benefícios, que tornaram mais certos aqueles deveres, mais leve e suave o seu cumprimento, e mais frutuosos para merecerem a glória celeste.

 Professavam, com efeito, o respeito para com os seus senhores, honravam-nos como homens revestidos da autoridade de Deus, origem de todo o poder, e não eram movidos a isto por medo dos castigos, pela astúcia ou pela ambição, mas pela consciência do seu dever, pelo zelo da sua caridade. Reciprocamente, as justas exortações do Apóstolo dirigiam-se aos senhores, a fim de que tratassem com caridade os servos em compensação dos seus bons serviços: E vós, senhores, procedei do mesmo modo para com eles; não os ameaceis sabendo que o vosso Senhor e o deles está nos céus, e que diante dEle não há acepções de pessoas (Ef. VI, 9).

Eram igualmente exortados a considerar que, assim como não é justo para o servo o queixar-se de sua sorte, pois que é liberto do Senhor, assim também não é permitido ao homem livre, porque é o servo do Senhor (I. Cor. VII, 22), ostentar altivez e mandar com orgulho. Por isso, foi ordenado aos senhores que reconhecessem a dignidade humana nos servos, e que os tratassem convenientemente, considerando-os não como sendo de natureza diferente, mas iguais a si pela religião e pela comunidade de servidão para com a majestade do Senhor comum.

Estas leis, tão justas e tão adaptadas a harmonizar as diversas partes da sociedade doméstica, foram praticadas pelos mesmos Apóstolos. Bem digno de notar-se é o exemplo de São Paulo quando escrevia com tanta benevolência em favor de Onésimo, escravo fugitivo de Filémon, que enviou a este com terna recomendação: Recebe-o como muito querido do meu coração... não como um escravo, mas como um irmão querido segundo a carne e segundo o Senhor; porque se alguma coisa te prejudicou ou é teu devedor, imputa isto a mim (Ad Fil. 12-18).

A ação da Igreja

Por pouco que se compare um e outro modo de procedimento, o dos pagãos e o dos cristãos, para com os escravos, vê-se claramente que um era cruel e pernicioso, outro cheio de doçura e humanidade, e certamente que ninguém ousará negar à Igreja o mérito que lhe pertence por ter sido o instrumento duma tão grande indulgência. E tanto mais não negaremos à Igreja tal mérito, se atentamente se considerar com que doçura e com que prudência a Igreja extirpou e destruiu o abominável flagelo da escravatura. – Ela não quis, na verdade, proceder apressadamente à libertação dos escravos; o que certamente não poderia realizar senão de um modo tumultuoso que redundaria em detrimento da própria Igreja e da sociedade. Foi a razão porque, se na multidão de escravos que havia agregados aos fiéis, algum aparecia que, levado de esperança de liberdade, recorria à violência e à sedição, a Igreja reprovava e reprimia estes esforços condenáveis e empregava, por meio dos seus ministros, o remédio da paciência. Ensinava os escravos a persuadirem-se de que em virtude da luz da santa fé e do caráter cristão, eram sem dúvida muito superiores em dignidade aos senhores pagãos; mas que também eram mais estritamente obrigados, para com o próprio autor e fundador da fé, a não formarem desígnios hostis e a não faltarem em nada ao respeito e à obediência que lhes eram devidas; e desde o momento em que sabiam que eram chamados ao reino de Deus, dotados da liberdade de seus filhos e destinados a bens imortais, não se deviam afligir por causa da abjeção e dos males da vida caduca; mas, levantando os olhos ao céu, deviam consolar-se em suas santas resoluções.

 Foi aos homens reduzidos à escravidão que São Paulo se dirigiu, quando escrevia: A graça consiste em suportar por dever de consciência para com Deus, aflições e até sofrer injustamente. É nisto com efeito que consiste a vossa vocação, porque Jesus Cristo sofreu por vós, deixando-vos o exemplo para que O imitásseis (1. Petr. II, 19-21).

Esta tão levantada glória da solicitude unida à moderação, e que faz admiravelmente resplandecer a divina virtude da Igreja, sobe de ponto atendendo à grandeza de alma eminente e invencível, que pode inspirar e sustentar entre tantos humildes escravos. Era um espetáculo admirável o exemplo de boas obras que davam aos seus senhores, e não menos admirável o exemplo de sua grande paciência em todos os seus trabalhos, sem que nunca fosse possível levá-los a preferir as ordens iníquas de seus senhores aos santos mandamentos de Deus, se bem que, com ânimo imperturbável, o rosto sereno, expiravam no meio dos mais atrozes tormentos.

 Eusébio celebra a memória da invencível constância de uma virgem de Patames, na Arábia, que, resistindo à licença de um senhor impudico, afrontou corajosamente a morte e, com o preço do seu sangue, permaneceu fiel a Cristo. Podem admirar-se outros exemplos dados por escravos, que resistiam firmemente até à morte aos seus senhores, que atentavam contra a liberdade de sua alma e contra a fé que tinham jurado a Deus. Quanto a escravos cristãos que, por outros motivos, teriam resistido aos seus senhores ou tramado conspirações prejudiciais ao Estado, a história não cita um só exemplo.

 Quando alvoreceu para a Igreja a era da paz e da tranquilidade, os Santos Padres expuseram com admirável sabedoria os ensinamentos apostólicos sobre a união fraternal dos corações entre os cristãos, e com igual caridade aplicaram estes ensinamentos em proveito dos escravos, esforçando-se em persuadi-los de que os senhores tinham sem dúvida legítimos direitos sobre o trabalho dos seus servos, mas que de nenhum modo lhes era permitido terem poder absoluto sobre a sua vida e tratá-los com sevícia cruel.

 São Crisóstomo tornou-se notável entre os gregos, tratando-se muitas vezes deste ponto e afirmando com um coração e linguagem cheia de franqueza que a escravatura, segundo a antiga significação da palavra, já então havia sido suprimida por um insigne benefício da fé cristã, a ponto de que, entre os discípulos do Senhor, a mesma escravatura parecia e era de fato um nome sem realidade. Com efeito Jesus Cristo (e assim raciocina, em resumo, o Santo Doutor) desde o momento em que, pela sua soberana misericórdia para conosco, apagou a culpa original, curou também a corrupção que daquela falta resultara nas diversas classes da sociedade humana; portanto, assim como graças a Jesus Cristo, a morte perdeu os seus horrores e não é senão uma tranquila passagem à vida bem-aventurada, assim também a escravatura foi suprimida. Se o cristão não é escravo do pecado, não pode com razão chamar-se escravo.

 Todos os que foram regenerados e adotados por Jesus Cristo são completamente irmãos; é desta nova procriação e desta adoção na família do mesmo Deus que deriva a nossa glória; é da verdade e não da nobreza de sangue que provém a nossa dignidade; e, para que a forma desta fraternidade evangélica produza um fruto mais abundante, é de toda a necessidade que, ainda mesmo nas relações exteriores da vida, se manifeste numa reciprocidade mútua de bons ofícios, de modo que os escravos sejam tratados como domésticos e membros da família, e que os chefes da família lhes forneçam, não só o que é necessário para o sustento da vida, mas também todos os socorros da religião. Enfim, a saudade singular que São Paulo envia a Filémon, desejando a graça e a paz à Igreja que está em sua casa (Ad. Phil., v.2), é um como ensinamento de que os senhores e os escravos, entre os quais existe a comunhão da fé, devem igualmente ter entre si a comunhão da caridade (Hom. XXIX, in Gen., or in Lazar., Hom. XIX, in ep. I ad Cor., Hom. 1 in ep. ad Phil.).

 Entre os latinos podemos mencionar Santo Ambrósio que tão diligentemente investigou, a este propósito, as razões das relações sociais e que, melhor que ninguém, precisou segundo as leis cristãs o que pertence a uma e a outra categoria; e é desnecessário dizer que as suas doutrinas se harmonizam perfeitamente com as de Crisóstomo (De Abr., De Jacob et vita beata c. III de Patr. Joseph, c. IV, Exhort. virgin. c. I.).

 Vê-se que tais ensinamentos eram de alta justiça e utilidade, e, o que é capital, eram inteira e fielmente observados onde quer que o cristianismo floresceu.

Se assim não fora, Lactâncio, esse eminente defensor da religião, não ousaria certamente dizer, falando de alguma sorte como testemunha: Alguns fazem-nos esta censura: Não há entre vós pobres e ricos, escravos e senhores? Não há porventura diferenças entre vós? Não; e a razão porque uns aos outros damos o nome de irmãos, não é outra senão porque todos nos julgamos iguais; porque desde o momento em que consideramos todas as coisas humanas, não sob o ponto de vista corpóreo mas espiritual, ainda que a condição do corpo é diversa, todavia para nós não há escravos, mas nós os temos como irmãos e tais os chamamos com referência ao espírito, em quanto que somos co-escravos quanto à religião (Divin. Instit. I. v. c. 6.).

Solicitude da Igreja pelos escravos

A solicitude da Igreja na tutela dos escravos era de dia para dia mais entranhada, e, aproveitando toda a oportunidade a que (tal) solicitude tendia lograr com a devida prudência, que lhes fosse enfim concedida a liberdade, o que certamente lhes era também de grande proveito para a eterna salvação.

 Os anais da história eclesiástica dão testemunho de que os fatos corresponderam a esta solicitude. Contribuíram poderosamente para isso nobres matronas, dignas por isso dos louvores de São Jerônimo. A este propósito conta: Sabíamos que, nas famílias cristãs ainda nas que não eram opulentas, não raras vezes sucedia que os escravos eram generosamente restituídos à liberdade. Ainda mais, São Clemente havia louvado muito antes o testemunho de caridade dado por alguns cristãos, os quais, oferecendo as suas pessoas em lugar de outras, se sujeitaram à escravidão para libertar os escravos que de outro modo não podiam libertar (1 Ef. ad Cor., c. 55.).

Eis porque a libertação dos escravos começa a realizar-se nos templos como um ato de piedade e a Igreja o institui como tal, recomendando aos fiéis que o pratiquem nos seus testamentos a título de ato agradável a Deus e digno a seus olhos de grande mérito e recompensas e daí vem estas palavras pelas quais era dado aos herdeiros a ordem de libertação dos escravos: pelo amor de Deus, para a salvação ou para o merecimento de minha alma. Nada se omitia que pudesse servir para resgate dos cativos: vendiam-se os bens dados a Deus; fundiram-se os vasos sagrados de ouro e prata; vendiam-se os ornamentos e as riquezas das basílicas, como por mais que de uma vez fizeram os Ambrósios, os Agostinhos, os Hilários, os Elói, os Patrícios e outros muitos personagens santos.

 Grandes coisas foram feitas em favor dos escravos pelos Pontífices Romanos, os quais foram verdadeiramente os defensores dos fracos e os vingadores dos oprimidos. S. Gregório o Grande, deu a liberdade ao maior número de escravos que lhe foi possível, e no Concílio romano de 597 quis que fosse dada a liberdade aos que quisessem seguir a vida monástica.

 Adriano I ensinou que os escravos podiam livremente contrair matrimônio, ainda mesmo contra a vontade dos seus senhores. Em 1167, foi abertamente intimado por Alexandre III ao rei mouro de Valença que não tornasse escravo nenhum cristão, porque ninguém é escravo por natureza e Deus a todos criou livres. Em 1198, Inocêncio III aprovou e confirmou a pedido dos fundadores João da Matha e Félix de Valois, a Ordem da Santíssima Trindade para redenção dos cristãos, que haviam caído em poder dos turcos.

 Uma Ordem semelhante, a de Nossa Senhora das Mercês, foi aprovada por Honório III e depois por Gregório IX, Ordem que São Pedro Nolasco havia fundado com esta lei severa que os seus religiosos se entregassem à escravidão em lugar dos cristãos cativos, se tanto fosse necessário para os libertar. Gregório IX assegurou à liberdade um mais vasto asilo, decretando que era proibido vender escravos à Igreja, e exortou aos fiéis a que, em expiação das suas culpas, oferecessem os seus escravos a Deus e aos Santos.

Poderíamos a este propósito assinalar muitos outros benefícios prestados pela Igreja que constantemente defendeu, empregando para este fim a severidade das suas penas, os escravos contra os processos violentos e perniciosos ultrajes dos seus senhores; aos oprimidos pela violência oferecia o refúgio dos seus templos; ordenou que os libertos fossem admitidos a depor nos tribunais, repreendeu e corrigiu os que por meio de tramas condenáveis intentavam reduzir homens livres ao estado de escravidão. A Igreja favoreceu sempre a liberdade dos escravos que de qualquer modo lhe pertenciam, segundo os tempos e os lugares, quer estabelecendo que todo o laço de escravidão pudesse ser dissolvido pelo Bispo em favor dos que, durante um certo tempo, dessem provas de uma vida digna de louvor, que permitindo ao Bispo que declarasse livres os que espontaneamente lhe eram dedicados.

 Deve atribuir-se também ao espírito de misericórdia e ao poder da Igreja o ser mitigada em favor dos escravos a severidade das leis civis; e as disposições suaves estabelecidas acerca de escravos, por São Gregório o Grande, foram adotadas pelos códigos das nações, graças sobretudo a Carlos Magno, que as introduziu nas suas Capitulares, do mesmo modo que ao depois Graciano no seu Decreto.

Enfim, no decurso das idades, os monumentos, as leis, as instituições, tem constantemente proclamado, por meio de testemunhos magníficos, a soberana caridade da Igreja para com os escravos, cuja condição humilhante a Igreja não só não deixou sem tutela, senão que também sempre procurou aliviar.

 Assim bem digna é a Igreja Católica de ser honrada, exaltada e do reconhecimento de todos, e bem digna de que se proclame que bem mereceu da prosperidade dos povos, destruindo a escravatura por um benefício inapreciável de Cristo Redentor, e garantindo aos homens a verdadeira liberdade, fraternidade e igualdade.

 No último quartel do século XV, quando o funesto flagelo da escravatura havia desaparecido das nações cristãs, os Estados se forçaram por se consolidarem sobre a base da liberdade evangélica e dilatar os limites de seu Império, a Sé Apostólica velava com o maior cuidado a fim de impedir que novamente surgisse a escravatura. Para isto olhou com especial cuidado para as regiões novamente descobertas da África, da Ásia e da América; espalhara-se, com efeito, a notícia de que os chefes das expedições ainda que cristãos, injustamente empregavam as suas armas e os seus talentos para estabelecer e impor a escravidão entre aquelas populações inofensivas. A áspera natureza do solo que tentavam subjugar, as riquezas metalíferas que tentavam explorar e que exigiam enormes trabalhos, levaram aquelas expedições a adotar planos absolutamente injustos e desumanos. Para isso começou-se a exercer o tráfico de escravos trazidos da Etiópia, tráfico a que se chamou escravatura dos negros e que largamente se propagou naquelas colônias.

 Por um tal excesso praticou-se com os indígenas, geralmente designados sob o nome de Indianos, uma opressão semelhante à escravatura. Desde que foi conhecido com certeza este estado de coisas, Pio II dirigiu-se imediatamente à autoridade episcopal do lugar onde se exercia a escravatura, por uma carta na qual repreende e condena tão grave iniquidade. Pouco depois Leão X exerce, quanto possível, os seus bons ofícios e a sua autoridade junto aos reis de Portugal e Espanha a fim de que tomem a peito extirpar completamente um tal excesso, tão contrário à religião como à humanidade e à justiça. Todavia a calamidade da escravatura lançou profundas raízes, por causa da persistência de sua causa ignóbil, que era a inextinguível sede do lucro. Então Paulo III, preocupado em sua caridade paternal com a condição dos escravos indianos, chegou ao extremo de se pronunciar publicamente sobre esta questão e por assim dizer em face de todas as nações, por decreto solene, estabelecendo que se devia reconhecer uma tríplice faculdade justa e própria a todos aqueles indígenas, a saber que cada um deles pudesse ser senhor de sua pessoa, que pudesse viver em sociedade segundo as suas leis e que pudessem adquirir e possuir bens. Confirmou isto mais amplamente por cartas ao Cardeal Arcebispo de Toledo, estabelecendo nelas que os que transgredissem aquele decreto seriam punidos com Interdito e que era absolutamente reservado ao Pontífice Romano a faculdade de os absolver (Veritas ipsa, 2 Inn, 1559).

Em defesa da liberdade dos índios e dos negros

Com igual solicitude e constância, outros Pontífices como Urbano VIII e Bento XIV se mostraram valentes defensores da liberdade em favor dos indianos e dos negros e daqueles que ainda não tinham recebido a fé cristã. Foi ainda Pio VII que por ocasião do congresso realizado em Viena pelos príncipes confederados da Europa, chamou a sua atenção comum, entre outras coisas, para o tráfico dos negros, a fim de que fosse prontamente abolido, já em desuso em muitas localidades. Gregório XVI também admoestou gravemente aqueles que, sobre aquele ponto, violaram as leis e os deveres da humanidade; renovou os decretos e as penas impostas pela Sé Apostólica, e nada omitiu que pudesse levar as nações longínquas a imitar a mansidão da nações europeias, a aborrecer e evitar a ignomínia e a crueldade da escravatura (In supremo Apostolus fastigio, 3 dec. 1857).

Sucedeu-Nos muito oportunamente o termos recebido as felicitações dos depositários supremos do poder público, por termos obtido, graças a perseverantes instâncias, que se fizesse justiça às reiteradas e justas reclamações da natureza e da religião.

 Resta-nos todavia um outro cuidado, que vivamente nos preocupa com referência a um assunto semelhante e que reclama a Nossa solicitude. É que se o ignóbil tráfico de seres humanos cessou realmente sobre o mar, é largamente praticado na terra e com muita barbaridade, principalmente em certos lugares da África. Com efeito, desde o momento em que aos olhos dos maometanos, os etíopes e os habitantes de nações semelhantes são considerados apenas como alguma coisa superiores aos brutos, facilmente podemos conceber com amargura, com que pérfida e crueldade são tratados. Invadem subitamente, com a violência e processos dos ladrões, as tribos etíopes, que surpreendem de improviso; invadem as cidades, as vilas e os campos, devastando e assolando tudo, arrebanham, como presa fácil de conquistar, os homens, as mulheres e as crianças e conduzem-nos à viva força para os tráficos mais infames. É do Egito, de Zanzibar e também em parte do Sudão, como de outras tantas estações, que partem estas abomináveis expedições; obrigam a percorrer longos caminhos a homens carregados de cadeias, sustentados com uma alimentação miserável e feridos com horríveis açoites; os que não podem suportar tantas fadigas são mortos; os que sobrevivem são condenados a serem vendidos em massa e expostos diante de compradores cruéis e cínicos. Os assim vendidos viam-se expostos à deplorável separação de suas mulheres, de seus filhos, de seus pais, e o senhor, em cujo poder caíam, os sujeitava a uma escravidão duríssima e abominável, obrigando-os até a abraçarem a religião de Maomé. Com grande mágoa de nosso coração ouvimos ainda há pouco estas coisas dos próprios lábios daqueles que, com lágrimas nos olhos, foram testemunhas de uma tão infame ignomínia, e a sua narração é confirmada pelos modernos exploradores da África equatorial. Vê-se do seu testemunho que o número dos africanos vendidos deste modo, como se fossem um rebanho de bestas, é de quatrocentos mil, a metade dos quais pouco mais ou menos, depois de duros açoites durante um longo caminho, sucumbem miseravelmente, a ponto de que os viajantes, como é triste dizê-lo!, seguem os vestígios dos restos de tantas ossadas.

 Quem não se comoverá em presença de tão grandes males? Quanto a Nós, Vigário de Cristo, o libertador e redentor amantíssimo de todos os homens, e que vivamente Nos alegramos com os méritos tão numerosos e gloriosos da Igreja para com todos os desgraçados, dificilmente podemos exprimir a comiseração da nossa alma para com aquelas populações desventuradas, a imensa caridade com que lhes abrimos os braços, e o quanto ardentemente desejamos procurar-lhes os socorros e alívios possíveis, a fim de que libertados da escravidão dos homens e da superstição, lhes seja finalmente concedido servirem o único e verdadeiro Deus, sob o jugo suavíssimo de Cristo, e serem admitidos conosco à herança divina. Praza a Deus que todos os que se acham investidos do poder e da autoridade, queiram salvaguardar os direitos das gentes e da humanidade, ou que sinceramente se dediquem ao progresso da religião, se esforcem todos ardentemente sob as Nossas instâncias e exortações, a reprimirem, impedirem e abolirem aquele tráfico, o mais ignóbil e infame que se pode imaginar!

Graças a um movimento mais acentuado do talento e da atividade, abrem-se novos caminhos para as regiões africanas e estabelecem-se novas relações comerciais, e os homens dedicados ao apostolado trabalham, podendo assim dedicarem-se melhor à salvação e libertação dos escravos. E não conseguirão feliz resultado nos seus trabalhos senão enquanto, fortalecidos pela graça, se consagrarem totalmente à propagação da Nossa santa fé e trabalharem cada vez com mais adorno no seu desenvolvimento, porque é fruto insigne desta fé o fomentar e favorecer admiravelmente a liberdade com a qual fomos libertados por Cristo (Galat. IV, 31.). Para este fim Nós os exortamos a considerar, como num espelho de virtude apostólica, a vida e obras de Pedro Claver, a quem ultimamente decretamos as honras do altar; a admirável constância com que totalmente se consagrou, durante 40 anos consecutivos, ao ministério daquelas desgraçadas multidões de escravos negros, fez com que fosse considerado o apóstolo daqueles de quem ele mesmo se dizia e era assíduo servo. Se os missionários copiarem e reproduzirem em si a caridade e a paciência deste apóstolo, tornar-se-ão seguramente dignos ministros da salvação, consoladores mensageiros da paz, e ser-lhes-á dado, mediante Deus, converter a desolação, a barbárie, a ferocidade, em feliz prosperidade da religião e da civilização.

A abolição no Brasil

Sentimos o ardente desejo de convergir para vós, Veneráveis Irmãos, o Nosso pensamento e as presentes letras, para de novo vos manifestar e compartilhar convosco a grande alegria que experimentamos por causa das resoluções publicamente adotadas no Império do Brasil relativamente à escravatura. Com efeito, desde o momento em que a lei determinou que todos os que ainda se achavam na condição de escravos fossem imediatamente admitidos à classe e direitos de homens livres, não somente isto Nos pareceu em si bom e salutar, mas ainda vimos animada e confirmada a esperança de fatos que no futuro muito hão de influir nos interesses civis e religiosos. Deste modo, o nome do Império do Brasil será justamente celebrado com louvor em todas as nações civilizadas e ao mesmo tempo o nome do augusto Imperador, a quem se atribui este belo pensamento, “que o seu maior desejo é ver prontamente abolidos nos seus Estados qualquer vestígio de escravatura”.

 Mas entretanto que se cumpram aquelas prescrições da lei, Nós vos pedimos que vos dediqueis ativamente com toda a vossa autoridade, e que consagreis os vossos cuidados na execução daquela obra que deve superar não pequenas dificuldades. A vós pertence fazer com que os senhores e escravos se concertem entre si e com toda a boa fé, que não seja violada a clemência e a justiça, que todas as transações sejam legítimas e cristãmente resolvidas. É muito para desejar que a supressão e a abolição da escravatura, de todos querida, se realize felizmente, sem o menor detrimento do direito divino e humano, sem transtorno público, e de modo a garantir a utilidade estável dos escravos.

 A cada um destes, bem como aos que já estão livres, como aos que vierem a sê-lo, dirigimos com zelo pastoral e coração de pai alguns ensinamentos salutares, tirados dos oráculos do grande Apóstolo das gentes. Guardem religiosamente a lembrança e o sentimento de gratidão, e manifestem-no com cuidado para com aqueles a cujos cuidados devem o ter recuperado a liberdade. Não se tornem nunca indignos de um tão grande benefício, e não confundam nunca a liberdade com a licença das paixões; pelo contrário usem a liberdade como convém a cidadãos honestos, para o trabalho de uma vida ativa, para o bem da família e do Estado. Cumpram assiduamente, não tanto pelo temor como pelo espírito de religião, o dever de respeitar e honrar a majestade dos príncipes, de obedecer aos magistrados, de observar as leis; abstenham-se de invejar as riquezas e a superioridade de outrem, porque é muito para lamentar que um grande número dentre os mais pobres se deixem dominar daquela inveja, que é a fonte abundante de muitas obras de iniquidade, contrárias à segurança e à paz da ordem restabelecida. Contentes antes com a sua sorte e com os seus bens, nada tenham tanto a peito, e nada desejem tanto como os bens celestes para alcançar os quais foram criados e remidos por Jesus Cristo; que sejam animados de piedade para com Deus, seu Senhor e Libertador, que O amem com todas as suas forças, que observem os seus mandamentos com toda a fidelidade. Que se gloriem de serem filhos da sua Esposa, a Santa Igreja, que se esforcem por serem dignos dela e que correspondam tanto quanto possam ao seu amor amando-a.

 Insisti, Veneráveis Irmãos, para que os libertos sejam profundamente imbuídos destes ensinamentos, a fim de que, como Nós o desejamos convosco e com todos os bons, a religião assegure para sempre em toda a extensão do Império os frutos da liberdade que é outorgada.

 A fim de que tudo seja realizado, pedimos e imploramos de Deus abundantes graças, mediante a intercessão maternal da Virgem Imaculada. Como penhor dos favores celestes e em testemunho da Nossa paternal benevolência, Nós concedemos afetuosamente a benção apostólica a vós, Veneráveis Irmãos, ao clero e a todo o povo.

Dada em Roma, junto de São Pedro, aos 5 de Maio de 1888, undécimo ano do Nosso Pontificado.

LEÃO XIII, PAPA








[1] Legionário, N° 296, 15 de Maio de 1938, págs. 1, 4 e 7

<https://www.pliniocorreadeoliveira.info/Leao13_18880505_libertacao_escravos.htm>

segunda-feira, 26 de junho de 2023

Não julgueis e não sereis julgados

 


 “Não julgueis e não sereis julgados” (Mt 7,1)


(Segunda-feira da 12ª Semana Comum)

 

 

Uma das célebres frases do famoso monge trapista Thomas Merton é: “A distância mais longa é aquela entre a cabeça e o coração!” Isto nos leva à dedução de que nem tudo aquilo que vemos ou ouvimos chegará ao nosso coração, porque, devido ao longo caminho, antes de chegar já será esquecido ou deixado de lado.

Isto pode acontecer também conosco quando lemos ou escutamos a Palavra de Deus. Nem sempre ela chega ao nosso coração. Na missa, a maioria das vezes a Palavra entra por um ouvido e sai pelo outro. Isto pode suceder com o Evangelho apenas proclamado.

O texto de hoje é a parte do Sermão da Montanha em que Jesus  ensina como deve ser a vida em comunidade (Mt 7,1-12). Nesta parte, ele estabelece algumas regras para uma nova forma de convivência comunitária de seus discípulos, que tem seu ponto alto com a chamada regra de ouro: “Tudo quanto quereis que os outros vos façam, fazei também a eles” (Mt 7,12). 

A primeira norma é “Não julgueis e não sereis julgados”. É uma exigência muito contundente e parece que em geral não se enraíza bem no nosso coração. Por isso, se nos auto-observarmos, poderemos constatar que a maioria tem o vício de julgar e falar mal dos outros. Com um pouco de observação, é muito fácil perceber que julgar e falar mal de alguém é algo muito mais comum do que se pensa. É normal ouvir essas sentenças: “Esse sujeito não vale nada!”, “Aquele cara aí. Ele tem parte com o demônio!”, “O ciclano não tem onde cair morto, mas fica ostentando!”, “Fulana gasta demais com a cabeleireira!”, “Aquele padre é comunista!” ou “Aquele outro é um vendido, um fascista!”, etc., etc.

O Papa Francisco numa de suas meditações sobre este assunto, frisou: «é muito feio julgar: deixemos o julgamento só a Deus, só a ele!». A nós compete «o amor, a compreensão, rezar pelos outros quando vemos coisas que não são boas», se serve «também falar com eles» para os admoestar se algo parece não estar no caminho certo. De qualquer forma «nunca julgar, nunca», porque «se julgarmos será hipocrisia». Afirmou ainda Francisco, «quando julgamos colocamo-nos no lugar de Deus, isto é verdade, mas o nosso juízo é pobre: nunca, nunca pode ser um verdadeiro julgamento». Porque, «o verdadeiro julgamento é o que Deus faz». E «por que o nosso não pode ser como o de Deus? Por que Deus é Onipotente e nós não? Não, porque ao nosso julgamento falta a misericórdia». E «quando Deus julga, fá-lo com misericórdia».

Na conclusão o Papa sugeriu que pensemos «hoje naquilo que o Senhor nos diz: não julgar, para não ser julgado, a medida com a qual julgarmos será a mesma que usarão para conosco; e, terceiro, olhemo-nos ao espelho antes de julgar». E assim quando temos a tentação de dizer: «ela faz isto, ele faz aquilo», é melhor olhar-se ao espelho antes de falar. Caso contrário, «serei um hipócrita — reiterou Francisco — porque me coloco no lugar de Deus». E contudo «o meu julgamento é pobre: falta algo tão importante que o juízo de Deus possui, falta a misericórdia». O Senhor, auspiciou o Papa, «nos faça compreender bem estas coisas».[ [1] ]

O Papa Francisco diz que, além o caminho da cabeça ao coração, a Palavra de Deus deve percorrer mais um caminho dentro de nós: do coração para as mãos, ou seja, para a ação. Deve ser escutada (ou lida) e enviada para o coração; ao chegar ao coração deve ser meditada e rezada e depois enviada às mãos, às boas obras. Eis o percurso da Palavra de Deus: dos ouvidos ao coração e às mãos.[ [2] ]

 

Dom Frei Wilmar Santin, O.Carm.

Belém, 25 de junho de 2023.



[1] Meditação na Casa Santa Marta, 20 de junho de 2016.

[2] Cf. Audiência Geral, 31 de janeiro 2018.

sexta-feira, 2 de junho de 2023

Salpicado de cruzes toscas e negras

  


Salpicado de cruzes toscas e negras

 

 

Ao ler o livro “Entre as Ninfeias” de João Marques de Carvalho (1866 — 1910), publicado no ano de 1896, em Buenos Aires, o conto “O cemitério da floresta” mexeu com meus sentimentos. As reminiscências e reflexões do autor levaram-me a um certo confrangimento interior e fez-me recordar de alguns cemitérios e de alguns conhecidos e amigos que já estão na eternidade.

Marques de Carvalho narra que estava num barco viajando pelo rio Amazonas. A súbitas avista a imagem de um cemitério que o impactou e o levou a algumas ponderações: “Cortada em rápido declive sobre a beira da água, em meio à floresta densa, abandonada de todos, uma clareira fazia-se abrupta e essa clareira era um cemitério, um pequeno campo santo solitário e melancólico, — simpático todavia, — salpicado de cruzes toscas e negras!

A expressão de que o cemitério era uma clareira “abandonada de todos”, produziu em mim a sensação de que era um cemitério abandonado e se tornou maior com o reforço: “De quem são aqueles despojos materiais ali inumados, longe dos centros de povoação, roubados ao conhecimento mundano, subtraídos à vaidade dos homens, entregues à terra com toda a simpleza das grandes devoluções pungentes, restituídos à obscuridade do nada para sempre, para sempre furtados à última recordação marmórea que lhes lembrasse o nome na derradeira falsidade dos epitáfios campanudos?"

Enquanto lia o conto, aflorou em minha memória um cemitério, situado à margem esquerda do rio Amazonas, abaixo de Manaus e da pequena vila Jatuarana. Fui lá pescar e avistei, na margem que desbarrancava, um cemitério no meio da mata. Na ocasião deu-me uma grande angústia pelo estado de abandono daquele campo santo. Cruzes, sem nomes, pensas no barranco, que certamente na enchente seguinte cairiam. Aquelas covas desapareceriam para sempre. A memória daquelas pessoas se perderia. Constantemente aquela imagem me vem à mente.

Ao visitarmos qualquer cemitério, é normal encontrarmos túmulos bem cuidados com flores, coroas e sinais de que há pessoas que curam com esmero a última morada do ente querido. Mas também vemos covas e sepulcros bastante ou totalmente descuidados e sem sequer uma indicação de quem está ali. Esta realidade me  faz recordar o livro bíblico do Eclesiástico. Diz o autor sagrado: “Vamos fazer o elogio dos homens famosos, nossos antepassados através das gerações. Outros não deixaram lembrança alguma, desaparecendo como se não tivessem existido. Viveram como se não tivessem vivido, e seus filhos também, depois deles. Mas estes, ao contrário, são homens de misericórdia; seus gestos de bondade não serão esquecidos. Eles permanecem com seus descendentes; seus próprios netos são a sua melhor herança. A descendência deles mantém-se fiel às alianças, e, graças a eles, também os seus filhos. Sua descendência permanece para sempre, e sua glória jamais se apagará” (Eclo 44,1.9-13).

O ser humano é o único animal que sepulta seus mortos de forma ritualizada. Alguns estudiosos afirmam que essa tradição remonta a no mínimo 130.000 anos, ou seja, ao tempo dos neandertais. Sei lá, mas é certo que “enterrar os mortos” é a 7ª obra de misericórdia. Só para refrescar a memória: “As obras de misericórdia são as ações caridosas pelas quais vamos em ajuda do nosso próximo, nas suas necessidades corporais e espirituais” (Catecismo da Igreja Católica, 2447).

 As 7 Obras de misericórdia corporais são:

1) Dar de comer a que tem fome; 

2) Dar de beber a quem tem sede; 

3) Dar pousada aos peregrinos; 

4) Vestir os nus; 

5) Visitar os enfermos; 

6) Visitar os presos 

7) Enterrar os mortos.   

As 7 Obras de misericórdia espirituais são:  

1) Ensinar os ignorantes;  

2) Dar bom conselho;  

3) Corrigir os que erram;  

4) Perdoar as injúrias;  

5) Consolar os tristes;  

6) Sofrer com paciência as fraquezas do nosso próximo; 

7) Rezar a Deus por vivos e defuntos.

Já passei por muitas aldeias indígenas e só vi 2 cemitérios: um na Missão São Francisco do rio Cururu e outro na aldeia Fortaleza no rio Andirá. Os dois são totalmente diferentes e expressam maneiras até opostas de ver o sepultamento. O cemitério da Missão (foto acima) é todinho limpo, a saber, ali não há árvores ou arbustos nem grama. Só há os montes de terra indicando as covas e cruzes com os nomes dos mortos – a maioria com as datas de nascimento e morte. Em torno de cada cova, há como que uma cerca de pedras demarcando-a. Não há um túmulo sequer. Todos foram sepultados diretamente na terra, inclusive um irmão franciscano e 2 freiras. São os Munduruku que sepultam seus mortos naquele cemitério.

Na aldeia Fortaleza do rio Andirá, os Sateré-Maué sepultam seus mortos num cemitério situado contíguo à aldeia na mata. Nem se percebe que é um cemitério, porque não se vê qualquer cova, nem cruzes ou nomes. No entanto, disseram-me que colocam uma cruz de madeira quando enterram alguém, mas depois que esta apodrece, não a repõem. Apesar de passar do lado algumas vezes, só fiquei sabendo que era ali o cemitério, porque perguntei. Não perguntei se eles costumam fazer alguma oração ou alguma cerimônia religiosa para o enterro de um membro da aldeia. Na Missão certamente se faz as Exéquias oficiais da Igreja Católica, uma vez que lá moram padres e irmãs e todos são batizados. 

Tenho conhecimento da existência de dois cemitérios de ribeirinhos no rio Tapajós. Saindo de Itaituba e subindo o rio Tapajós, em duas vilas, que se despopularizaram, há dois cemitérios abandonados. O primeiro é o cemitério da antiga vila Barreirinha, situada uns 30 km de Itaituba – via rodovia Transamazônica, e o segundo no porto Buburé, 70 km de Itaituba. Não conheço nenhum dos dois. Só ouvi falar que estão abandonados. Na Barreirinha fui uma vez, mas de noite e não deu para observá-lo. Com a instalação de uma fábrica de cimento, os moradores foram transferidos para uma nova vila em outro local ou simplesmente saíram de lá. Apenas restam a capela e o cemitério. Na capela é celebrada anualmente uma missa. O porto Buburé teve a sua importância no passado, mas atualmente só é usado pela população ribeirinha, que também diminuiu muito, para ir a algumas balsas-draga de garimpo e pelos os indígenas Munduruku de algumas aldeias que estão acima do porto. Também pescadores, como eu, iniciam ali sua aventura para evitarem a passagem pelas perigosas cachoeiras de São Luís. Sei que há um cemitério e que está abandonado, sendo que a mata já tomou conta. Esses dois cemitérios não correm o risco de desaparecerem por desbarrancamentos como o mencionado acima, visto que estão numa parte alta e um pouco distante da margem do rio.

No cemitério de Nova Londrina, onde nasci, tenho meu pai e meu irmão mais velho sepultados. Sempre que vou ao túmulo deles, faço um giro pelo cemitério olhando os sepulcros. Bate uma grande saudade que parece ficar entrelaçada com os ramos de cada árvore. Sempre me impressiono com o número de amigos e conhecidos que já estão nas mãos de Deus. Por crer na ressurreição, ao visitar um cemitério sempre faço uma oração por aqueles que estão ali sepultados. O fundamento para rezar pelos mortos está no segundo livro dos Macabeus. Este livro sagrado, conta que no dia seguinte à batalha contra Górgias, governador da Iduméia, Judas Macabeu determinou “que seus homens recolhessem os corpos daqueles que tinham morrido na batalha, a fim de sepultá-los ao lado dos parentes, nos túmulos de seus antepassados”. Então fizeram uma coleta e a enviaram a Jerusalém para que fosse oferecido um sacrifício pelos pecados dos soldados mortos. Para justificar a coleta e a oração pelos mortos, o livro bíblico sentencia: “Ele agiu com grande retidão e nobreza, pensando na ressurreição. Se não tivesse esperança na ressurreição dos que tinham morrido na batalha, seria coisa inútil e tola rezar pelos mortos. Mas, considerando que existe uma bela recompensa guardada para aqueles que são fiéis até a morte, então esse é um pensamento santo e piedoso. Por isso, mandou oferecer um sacrifício pelo pecado dos que tinham morrido, para que fossem libertados do pecado” (2Mac 12,43-45).

Li que nas regiões elevadas no Himalaia, há o costume de se fazer o chamado “funeral nos céus”. Trata-se de esquartejar o corpo do falecido e dar os pedaços aos abutres. É a solução que encontraram para dar um destino aos corpos, uma vez que o chão rochoso, cheio de pedras e congelado dificulta fazer a cova e a cremação seria muito difícil, devido à ausência de árvores que poderiam servir como lenha.

Esta prática, por mais repugnante que possa parecer, também é uma medida para impedir que as doenças se espalhem. Além disso, a religião budista, ali professada, ensina que a alma já migrou para outro domínio e o corpo é apenas um invólucro vazio. Os budistas veem isso como um ato sagrado, que sustentará a vida de outro ser vivo.

Para mim quando se fala em cemitérios, não é possível ficar sem lembrar das catacumbas em Roma, onde os cristãos enterravam seus mortos. Há em torno de 60 catacumbas mortuárias em Roma e arredores. Visitei três catacumbas várias vezes. A que mais visitei foi a de São Calisto. Mas também as de São Sebastião e Domitila. As três estão muito próximas uma da outra na via Ápia. A maior delas é a de São Calisto e ali se encontram os túmulos de diversos papas dos séculos II ao IV. Foi abandonada durante o século IX e redescoberta em 1854.

Em certa ocasião, há mais de 50 anos, eu estava numa kombi com escoteiros, tendo como motorista um padre alemão chamado Frei Jerônimo. Ele sempre foi muito cauteloso na condução de um veículo. Entramos numa rua preferencial. Ao chegamos no primeiro cruzamento, ele diminuiu a velocidade ao ponto de quase parar. Olhou para um lado e outro, como não viu nenhum carro se aproximando, seguiu em frente. Um dos escoteiros disse: 

- “Frei, nós estamos numa rua principal e temos a preferência!” 

- “Os cemitérios estão cheios de gente que tinha preferência no trânsito!”, respondeu o frei, sem nem olhar para trás.

Pensando bem, ao constatar que no trânsito urbano e nas estradas há tantos motoristas “barbeiros” ou irresponsáveis, é bom sempre se recordar o provérbio popular: “Cautela e caldo de galinha não fazem mal pra ninguém!”, porque senão o nosso destino será um cemitério mais cedo do que se espera.

Em julho de 1981 me encontrava em Princesa Isabel, PB, e fui fazer campanha vocacional numa capela com um grupo de carmelitas. Após a missa, fomos almoçar numa casa bem próxima ao cemitério. Antes do almoço alguém, olhando para o cemitério, disse: 

-“Esta é a primeira vez que vejo um cemitório!

Logo surgiu a pergunta: 

- “Que negócio esse, um cemitório?” 

O outro respondeu: 

- “É um mictório junto a um cemitério!” 

Caímos na gargalhada. É, dá pra fazer humor com cemitério sem ser tétrico ou pavoroso!

Rodou nas redes sociais um vídeo com uma canção cantada por Elton John, em inglês, mas com a tradução escrita em português. Algumas pessoas, que sabem a língua de William Shakespeare, me disseram que a tradução não correspondia às palavras cantadas. O texto da “tradução” me agradou e me levou a refletir sobre o comportamento de muitas pessoas diante de um morto e sobre o que fazem quando vão ao cemitério: levam flores e coroas. Isso serve para manifestar o sentimento que se tem em relação ao extinto. O texto fala por si só, sem necessidade de comentários: 

Você já percebeu o quanto o ser humano é estranho?

Pare para pensar! O ser humano briga com os vivos,

Mas leva flores para os mortos.

Lança os vivos ao nada,

Mas pede um lugar aos mortos.

Se afasta das pessoas quando vivas,

Mas quando essas pessoas morrem,

Se agarram desesperados nas lembranças

dos momentos que passaram ao lado delas.

Pois é, o ser humano é estranho.

O ser humano fica anos sem conversar com um vivo,

Mas se desculpa e faz até homenagem quando este morre.

Não tem tempo pra visitar quando a pessoa está viva,

Mas tem tempo até o dia todo 

Para ir e ficar no funeral desta pessoa.

Critica, fala mal, ofende quando a pessoa está viva,

Mas a santifica quando ela morre.

Não liga, não abraça, não se importa com os vivos,

Mas se autoflagela quando estes morrem.

Aos olhos cegos dos homens, 

O valor do ser humano está na sua morte e não na sua vida.

E sabe qual é a explicação de tudo isso?

Por que os mortos recebem mais atenção, carinho,

Passam a ser notados e recebem flores?

Porque o remorso é e sempre foi mais forte que a gratidão!

É bom pensarmos sobre isso enquanto estamos vivos...

A vida é um sopro!

Hoje estamos vivos, amanhã podemos não estar mais...

Então valorize quem você ama.

Não deixe para amanhã o que você pode fazer hoje!

Ame, perdoe, seja feliz ao lado da sua família, dos seus amigos...

Pare de criar confusão por coisas tão pequenas!

Lembre-se que a vida é um sopro!

Antes de homenagear quem já morreu,

Aprenda a valorizar quem está ainda vivo,

Porque depois que a pessoa vai embora

Até os defeitos viram saudades...

Lembre-se o maior presente que você pode dar a alguém 

É o seu tempo, a sua atenção, o seu carinho, o seu interesse

Faça isso antes que seja tarde demais....”

Vamos reverenciar os nossos mortos, mas muito mais vamos caprichar no relacionamento com os vivos, visto que Jesus Cristo, nosso Salvador, sentenciou: “Eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros. Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros. Nisto conhecerão todos que sois os meus discípulos: se vos amardes uns aos outros” (Jo 13,34-35)

 

+ Wilmar Santin, O.Carm.

 

 

 

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