quinta-feira, 7 de setembro de 2023

A pesca milagrosa (Lc 5,1-11)

 



A pesca milagrosa (Lc 5,1-11) 

 

O evangelista Lucas nos diz que Jesus “ensinava nas sinagogas e todos o elogiavam” (Lc 4, 13). Porém, quando Jesus foi à sinagoga de Nazaré, no dia de sábado, leu um texto de Isaías e ensinou, foi rejeitado (Lc 4,14-30). Ao retornar a Cafarnaum, tudo voltou ao normal: no sábado, ensinou na sinagoga e foi reconhecido como alguém que fala com autoridade (Lc 5,1-11). Apesar do reconhecimento e sucesso, Jesus percebeu que não podia pregar apenas nas sinagogas, porque seria manter-se na zona de conforto. Isso está evidente nas próprias palavras de Jesus: “Eu devo anunciar a Boa-Nova do Reino de Deus também a outras cidades” (Lc 4,43). Porém, não se limitou a ensinar ao povo das cidades, foi também para os campos e às margens do lago de Genesaré. Em todos os lugares, as multidões corriam “para ouvir a palavra de Deus” (v. 1). Portanto, todos percebiam que o ensino de Jesus era “Palavra de Deus”. As multidões eram atraídas por Jesus e sentiam prazer em ouvi-lo. Pudera, Jesus “ensinava como quem tem autoridade, não como os escribas” (Mt 7,29; Mc 1,22).

Às margens do lago de Genesaré teve contato com os pescadores Simão, André, Tiago e João. Simão Pedro ouviu os ensinamentos de Jesus, visto que foi da barca dele que Jesus “anunciou a Boa-Nova do Reino de Deus”. O texto sagrado diz: “Subindo numa das barcas, que era de Simão, Jesus pediu que se afastasse um pouco da margem. Depois sentou-se e, da barca,  ensinava as multidões” (v. 3).

Ao terminar de ensinar, Jesus viu que Simão tinha ficado extasiado e percebeu que ele poderia ser convocado para ser “pescador de homens”. Assim  começou uma ação para conquistar Simão em seu próprio campo: a pesca. Os pescadores tinham pescado a noite toda e tinham retornado com as redes vazias, ou seja, “o mar não estava para peixe” ou “a lua não estava boa”, como se diz popularmente. Simão e seus companheiros estavam cansados e frustrados. Mesmo assim, Jesus se animou e pediu para que Simão fizesse mais uma tentativa, mas que fosse “para águas mais profundas” (v. 4). A resposta de Simão, "Mestre, nós trabalhamos a noite inteira e nada pescamos” (v. 5), foi educada, expressando que que Jesus podia entender de reza e de boas mensagens, mas que de pesca os entendidos eram eles. No entanto, como ele tinha ficado impactado com as palavras de Jesus, concluiu: “Mas, em atenção à tua palavra, vou lançar as redes”. Portanto, Simão Pedro foi capaz de abrir mão da própria experiência de pescador para se deixar surpreender pela força da Palavra. Consequentemente a palavra de Jesus teve mais força do que a sua frustrante experiência da noite. O obedecer a Jesus e jogar as redes em águas mais profundas possibilitou o milagre da chamada pesca milagrosa.

Foi só depois desta dupla experiência, que Jesus chamou Pedro. Ele e seus companheiros, “fisgados” por Jesus, largaram tudo  e se tornaram “pescadores de homens”.

Muitas vezes pensamos que Deus deve fazer algo extraordinário, como essa pesca milagrosa, para termos a coragem de nos comprometermos radicalmente com a causa do Reino. Na época em que eu devia fazer os votos perpétuos, passei por isso: eu queria um sinal de que estava sendo chamando a ser carmelita e depois padre. Vivia numa crise. Numa conversa com frei Enedino, ele me disse que teve a mesma dificuldade. Só superou tudo quando percebeu que raramente Deus dá um grande sinal e que é nas experiências simples do dia-a-dia que Deus revela a sua vontade. Em seguida me perguntou: “Durante todo este tempo de formação seminarística, como você tem se sentido?” Respondi: “Muito bem e feliz!” Então ele me disse: “Este é o grande sinal de que você é chamado!”

Sem entrar em detalhes, após um acidente em que eu e um padre lá na Itália quase caímos num precipício, todo o povo dizia que foi um milagre. O velho pároco dizia que não foi milagre algum, que milagre é quando não acontece nada. Constantemente repetia: “Faz 46 anos que subo e desço esta montanha e nunca aconteceu nada! Como foi acontecer desta vez?” Não encontrava resposta. Dois dias após, durante o almoço, mais uma vez repetiu que tinham sido 46 anos sem acidente. Naquele momento lhe disse: “Então Pe. Mário, foram 46 anos de milagre!” Ele respirou fundo e disse: “Você tem razão, eu não tinha pensado nisso!” É, devemos estar atentos à presença e ação de Deus no corriqueiro de nossas vidas e não só nos momentos extraordinários!

Concluo com a palavras do Papa Francisco: “Não era um momento adequado para pescar, em plena luz do dia, mas Pedro confia em Jesus. Ele não se baseia nas estratégias dos pescadores, que conhecia bem, mas na novidade de Jesus. Naquela admiração que o levava a fazer o que Jesus lhe dizia. É assim também para nós: se acolhermos o Senhor na nossa barca, podemos fazer-nos ao largo. Com Jesus, navegamos no mar da vida sem temor, sem ceder à desilusão quando não pescamos nada, e sem ceder ao “não há mais nada a fazer”. Sempre, tanto na vida pessoal como na vida da Igreja e da sociedade, há algo de belo e corajoso que pode ser feito, sempre. Podemos recomeçar sempre, o Senhor convida-nos a pôr-nos sempre em questão porque Ele abre novas possibilidades. Aceitemos então o convite: afastemos o pessimismo e a desconfiança e façamo-nos ao largo com Jesus! Também a nossa pequena barca vazia testemunhará uma pesca milagrosa” (Angelus de 6 de fevereiro de 2022).

+ Wilmar Santin, O.Carm.

07 de setembro de 2023.

Quinta-feira da 22ª Semana do Tempo Comum

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