Carta do Encontro de Estudo do Instrumento de Trabalho
do Sínodo da Amazônia
“Cristo aponta para a Amazônia” - São Paulo VI
Reunidos em Belém do Pará, com o objetivo de estudar o Instrumento
de Trabalho do Sínodo da Amazônia, nós, bispos, padres, religiosas e
religiosos, leigas e leigos das Igrejas amazônicas, como também irmãs e irmãos
que compartilham a caminhada ecumênica, queremos manifestar nossas preocupações
com a “Casa Comum” e uma missão evangelizadora encarnada, samaritana e
ecológica.
Desde 1952, os bispos da Amazônia se reúnem periodicamente para se
posicionar sobre a missão da Igreja na realidade peculiar da Amazônia. “Cristo
aponta para a Amazônia” é a expressão profética e programática do Papa São
Paulo VI que em 1972 repercutiu no Encontro de Santarém. A nossa Igreja
assumiu, então, o compromisso de se “encarnar, na simplicidade”, na realidade
dos povos e de empenhar-se para que por meio da ação evangelizadora se tornasse
cada vez mais nítido o rosto de uma Igreja amazônica, comprometida com a
realidade dos povos e da terra. No encontro de 1990, em Belém-Icoaraci, os
bispos da Amazônia foram os primeiros a advertir o mundo para um iminente
desastre ecológico com “consequências catastróficas para todo o ecossistema
(que) ultrapassam, sem dúvida, as fronteiras do Brasil e do Continente”
(Documento “Em defesa da Vida na Amazônia”).
Novamente reunidos em Icoaraci/PA em 2016, os bispos da Amazônia
dirigiram uma carta ao Papa Francisco pedindo um Sínodo para a Amazônia.
Acolhendo o desejo da Igreja nos nove países amazônicos, o Papa convocou em 15
de outubro de 2017 a “Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Pan-Amazônia”,
com o tema “Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia
integral”.
A Igreja Católica desde o século XVII está presente na Amazônia
preocupando-se com a evangelização e a promoção humana ao mesmo tempo. Quantas
escolas, hospitais, oficinas, obras sociais se construíram e foram mantidas
durante séculos em todos os rincões da Amazônia. Vilas e cidades se edificaram
a partir das “missões” da nossa Igreja. Quanto sangue, suor e lágrimas foram
derramados na defesa dos direitos humanos e da dignidade, especialmente dos
mais pobres e excluídos da sociedade, dos povos originários e do meio ambiente
tão ameaçados. Lamentamos imensamente que hoje, em vez de serem apoiadas e
incentivadas, nossas lideranças são criminalizadas como inimigos da Pátria.
Junto com o Papa Francisco, defendemos de modo intransigente a
Amazônia e exigimos medidas urgentes dos Governos frente à agressão violenta e
irracional à natureza, à destruição inescrupulosa da floresta que mata a flora
e a fauna milenares com incêndios criminosamente provocados.
Ficamos angustiados e denunciamos o envenenamento de rios e lagos,
a poluição do ar pela fumaça que causa perigosa intoxicação, especialmente das
crianças, a pesca predatória, a invasão de terras indígenas por mineradoras,
garimpos e madeireiras, o comércio ilegal de produtos da biodiversidade.
A violência, que ultimamente cresceu de maneira assustadora, nos
causa horrores e exige também o engajamento da nossa Igreja para que a paz e o
respeito, a fraternidade e o amor prevaleçam.
Defendemos vigorosamente a Amazônia, que abrange quase 60% do
nosso Brasil. A soberania brasileira sobre essa parte da Amazônia é para nós
inquestionável. Entendemos, no entanto, e apoiamos a preocupação do mundo
inteiro a respeito deste macro-bioma que desempenha uma importantíssima função
reguladora do clima planetário. Todas as nações são chamadas a colaborar com os
países amazônicos e com as organizações locais que se empenham na preservação
da Amazônia, porque desta macrorregião depende a sobrevivência dos povos e do
ecossistema em outras partes do Brasil e do continente.
O Sínodo, convocado pelo Papa Francisco, chega num momento crucial
de nossa história. Queremos identificar novos caminhos para a evangelização dos
povos que habitam a Amazônia. Ao mesmo tempo, a Igreja se compromete com a
defesa desse chão sagrado que Deus criou em sua generosidade e que devemos
zelar e cultivar para as presentes e futuras gerações.
Cabe um agradecimento especial à Rede Eclesial Pan-Amazônica/REPAM
por todo o esforço dedicado no importante processo de ESCUTA das comunidades e
no envolvimento dos diversos segmentos do Povo de Deus, especialmente mulheres
e com forte participação das juventudes e dos povos originários.
Pedimos que rezem por nós, irmãs e irmãos, para que a caminhada
sinodal reflita “as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos
homens e das mulheres de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que
sofrem” (GS 1).
Que Maria de Nazaré, expressão da face materna de Deus no meio de
nosso povo, por sua intercessão, acompanhe os passos da Igreja de seu Filho nas
terras e águas amazônicas para que ela seja sinal e presença do Reino de Deus.
Que ajude, com sua missão evangelizadora e humanizadora, a dignificar cada vez
mais a vida em nossa região.
Belém, 30 de agosto de 2019.
Participantes do Encontro de
Estudo do Instrumento de Trabalho do Sínodo da Amazônia
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